Toda montadora gosta de basear o marketing de seus novos modelos na versão mais completa. Dá para entender; imagem, pelo menos no Brasil, vende mais do que praticidade. Porém, é muito comum, na apresentação oficial do modelo, que se fale das versões mais espartanas, muitas vezes mais interessantes que as top, usando mais os números – projeções de unidades fabricadas e de vendas por versão – do que, necessariamente, afirmações sobre suas qualidades.
É assim que acontece com as chamadas “picapinhas”, tão típicas do cenário automotivo brasileiro. Enquanto lá fora existem modelos e versões de picapes médias e grandes (para o nosso padrão) que jamais veremos por aqui – porque, para o brasileiro, picape média é carro de luxo –, a maioria dos brasileiros que precisam de um carro para o trabalho tem que se contentar com utilitários derivados de hatches pequenos. E para disfarçar a origem, as marcas sempre divulgam primeiro as fotos das versões top – Adventure, Cross, Escapade, Sport.
Nenhum fabricante nacional fora do quadrilátero Fiat-Ford-GM-VW tinha lançado uma picape pequena até hoje. A proposta da Peugeot, então, não deixa de ser bastante ousada, considerando que é a primeira “francesa” a pôr os pés na feira com um modelo inteiramente projetado e fabricado aqui. Custando a partir de R$ 31.400,00, a Hoggar X-Line 1.4 traz de série ajuste de altura do banco e do volante, além de trazer acabamento convincente e espaço razoável para os ocupantes. A caçamba, imensa, quase não tem o volume das caixas de rodas para atrapalhar a acomodação das cargas e a boa suspensão traseira independente traz muito conforto ao dirigir, a deixando quase em pé de igualdade com o 207. Em contrapartida, nem tampa do portaluvas ela tem e seu único opcional é o ar condicionado. A direção hidráulica não pode ser incluída nesta versão, que oferece somente a opção do motor 1.4 flex, com até 82 cv e 12,8 kgfm de torque a 3.250 rpm. É pouco, se pensarmos na enorme capacidade de carga (1.151 litros ou 742 kg, a maior do segmento). Apesar de ser bem gostoso dirigi-la, quando estiver cheia com certeza vai ser irritante conduzi-la (ainda mais com o ar condicionado ligado) ou bem difícil manobrá-la.
Suas concorrentes apostam em estratégias diferentes para conquistar o trabalhador. Custando R$ 31.615,00 no site da Ford, na prática é a Courier 1.6L Flex que acaba saindo mais em conta, graças aos descontos aplicados pela rede autorizada que derrubam seu preço para pouco mais de R$ 28 mil. O espaço na caçamba (1.050 litros ou 700 kg) ainda é seu principal argumento de vendas e, ainda que dê à picape da Ford somente o 4º lugar do comparativo, traz o mérito do bom aproveitamento do espaço - isso porque ela é larga e comprida, apesar de um pouco rasa. Junte a isto o bom desempenho do motor 1.6 Rocam de até 108,5 cv de potência e 15,6 kgfm de torque a 4.250 rpm e você tem uma ótima picape para entregar gás. Mas ainda derivada da geração antiga do Fiesta, com cabine apertada e design datado, sua defasagem frente à concorrência justifica o baixo número de vendas: parcas 2.249 unidades desde janeiro deste ano.
A Chevrolet Montana 1.4 Econo.Flex Conquest, mais barata de todas na tabela (R$ 30.084,00), concilia design ainda agradável, cabine com bom espaço, dirigibilidade interessante e desempenho idem. Está justamente no seu motor, que desenvolve até 105 cv e 13,4 kgfm a 2.800 rpm, a maior de suas vantagens: além de econômico, o bom torque em baixa rotação ajuda muito no transporte de carga nas cidades. Quanto ao espaço na caçamba, a picape da GM se beneficia de sua grande altura mais que de seu comprimento; assim, consegue o segundo maior volume e capacidade de carga (1.143 litros ou 735 kg). Em vendas, a Montana ocupa o terceiro lugar do segmento, atrás da Saveiro e da Strada, com 13.067 unidades vendidas de janeiro a abril.
A Fiat Strada Fire 1.4 Flex Cabine Simples, que custa R$ 30.440,00 no site da Fiat, convence o comprador com a resistência de sua suspensão, muito mais apropriada para o transporte frequente de cargas em terrenos acidentados. Tudo graças ao sistema de feixe de molas, que se, por um lado, compromete a dirigibilidade quando vazia e em terrenos lisos, por outro lado traz o benefício da rigidez e durabilidade. A capacidade de carga, de 1.100 litros ou 705 kg, fica aquém do que consegue Hoggar e Montana, mas não é de se desprezar. Novamente, porém, o bom desempenho da suspensão não é acompanhado por uma boa desenvoltura do motor, fraco para a proposta de carro de trabalho. O 1.4 Fire tem mais potência (até 86 cv), mas menos torque (12,5 kgfm a 3.500 rpm) que o da Hoggar (compará-lo com o da Montana, então, é covardia), e a Strada tem menos espaço na cabine, ficando à frente somente da Courier. Em vendas ela é a líder, com 33.285 unidades vendidas desde janeiro – mas deixemos claro que a maior parte deste bolo é de versões com cabines estendidas e duplas.
A VW Saveiro 1.6 Cabine Simples custa, no site, R$ 32.450,00. Básica, é a mais cara do comparativo, mas traz como principal argumento de vendas a renovação visual e a qualidade construtiva superior às das rivais. E o consumidor já tem percebido isso: em vendas ela já supera a Montana, com 17.063 unidades vendidas de janeiro a abril deste ano. Mesmo com cabine simples e na versão de entrada, seu design é fluido e bonito, sem exageros ou ressaltos (à exceção do degrau lateral, que virou moda). O espaço na cabine é bom, semelhante ao da Montana, e ainda que os materiais de acabamento sejam modestos, a qualidade de montagem é excelente. A Saveiro ainda traz boa dirigibilidade e uma suspensão bastante própria para o uso na cidade, sendo confortável mesmo vazia. Mas uma de suas principais vantagens acaba sendo também um revés, considerando que seu sistema de suspensão traseira, com eixo do Golf e molas helicoidais de ação progressiva, não é o mais apropriado para o transporte de carga. Ainda assim, sua caçamba comporta até 924 litros ou 715 kg e o motor 1.6 Flex VHT, com até 104 cv de potência e 15,6 kgfm de torque a 2.500 rpm, não tem problemas para enfrentar o trânsito com carga total.
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