terça-feira, 1 de abril de 2014

HIDROGÊNIO: SOLUÇÃO OU CONFUSÃO?


Fernando Calmon


Modelo de célula de combustível a hidrogênio da GM


Estudo recente da Shell prevê que petróleo e derivados só deixarão de ser fonte de abastecimento de veículos em 2070. O pico da demanda ocorreria em 2035, quando combustíveis alternativos, como o hidrogênio, passariam a representar papel crescente. Na realidade a tração elétrica terminaria por se impor, porém há duas vertentes para isso.



Uma seria a conhecida bateria, utilizada há mais de 100 anos, que continua a dever muito em autonomia, peso, volume, tempo de recarga e, em especial, preço, sem falar da infraestrutura a instalar. Também falta equacionar a origem de produção de eletricidade ainda centrada em carvão e gás natural. A depender da matriz energética de cada país, as emissões de CO2 (um dos gases responsáveis pelo aquecimento da atmosfera) poderão não diminuir em relação aos motores atuais mais eficientes. E se o abastecimento é com etanol de cana os elétricos não trariam vantagens (pelo contrário), se as preocupações fossem apenas mudanças climáticas.



A segunda opção para carros elétricos é a pilha a combustível. Conhecida desde 1838, tem fluxo contínuo de eletricidade. Há dois tipos: geração a bordo de hidrogênio por um reformador abastecido a gasolina, diesel, gás natural ou álcool (metanol ou etanol); fornecimento direto de hidrogênio a partir de um tanque pressurizado a 700 bar (3,5 vezes mais que um cilindro de GNV).



Modelo de célula de combustível a hidrogênio da Mercedes-Benz


Pilha a combustível (fuel cell, em inglês) tornou-se opção às baterias de automóveis há 20 anos. Hidrogênio combina-se ao oxigênio do ar para gerar eletricidade e subprodutos simples: calor e vapor d’água. Reformador a bordo perdeu interesse para o tanque de hidrogênio.



Embora vários fabricantes tenham desenvolvido protótipos, só a Honda iniciou uma experiência prática, em 2008, com 40 unidades. Hyundai, Toyota, Daimler, Nissan, BMW e Volkswagen, entre outras, se animaram e vão produzir automóveis com essa tecnologia em estágio bem inicial.



As empresas petrolíferas parecem conformadas de que a era do combustível de origem fóssil termina no século 21. Não pelo esgotamento e sim por restrições ambientais. A Shell afirma que pilha a hidrogênio para motores elétricos é a solução, mas exigirá uma rede capilar de postos de abastecimento a ser criada.





Só faltou combinar o discurso com os fabricantes de baterias. Elon Musk, dono da fábrica americana de carros elétricos Tesla, foi contundente. “É puro marketing, só papo-furado”, disparou. Musk, o bilionário fundador do site de pagamentos PayPal, não produz baterias. Mas, apostou que podia juntar milhares de pequenas unidades de íons de lítio, tamanho AA, e aumentar a autonomia de seu Model S para mais de 400 quilômetros, o que nenhum veículo elétrico alcançou.



A era do hidrogênio, no entanto, traz gigantescos desafios. Um posto básico desse gás custa, hoje, em torno de R$ 3,5 milhões, de cinco a oito vezes mais que um convencional. Também precisa se saber a fonte de obtenção do hidrogênio – a própria energia elétrica, uma delas – e estudar o balanço de CO2. E, finalmente, o preço de um automóvel com pilha a hidrogênio.



Portanto, continuam mais dúvidas do que certezas sobre como mover o mundo. Além da briga entre bateristas e hidrogenistas, cada um puxando para o seu lado.



Fernando Calmon, engenheiro e jornalista especializado desde 1967, quando produziu e apresentou o programa Grand Prix, na TV Tupi (RJ e SP) até 1980. Foi diretor de redação da revista Auto Esporte (77/82 e 90/96), editor de Automóveis de O Cruzeiro (70/75) e Manchete (84/90). Produziu e apresentou o programa Primeira Fila (85/94) em cinco redes de TV. 

Sua coluna semanal sobre automóveis, Alta Roda, começou em 1999. É publicada em uma rede de 86 jornais, revistas e sites. É correspondente para o Mercosul do site inglês just-auto. Além de palestrante, exerce consultoria em assuntos técnicos e de mercado na área automobilística e também em comunicação.

fernando@calmon.jor.br e www.twitter.com/fernandocalmon

Nenhum comentário:

Postar um comentário