Já não é novidade andarmos com modelos recém-lançados nas ruas e pessoas nos perguntarem que carro é aquele; faz parte. Mas nunca avaliamos um carro cuja marca, e não só o modelo, era desconhecida por 100% dos que pediram informações. Talvez por este motivo a Mahindra, marca indiana que tem produtos montados no Brasil pela Bramont na Zona Franca de Manaus, tenha resolvido relançar seu principal modelo no mercado: o Scorpio agora se chama M.O.V. (Mahindra Off-Road Vehicle) no Brasil.
Só um nome novo, porém, seria bobagem marqueteira. Ao introduzir um novo motor - sai o 2.6 turbodiesel common-rail com intercooler de 110 cv e 27,5 kgfm de torque e entra o novo mHawk 2.2 turbo VGT common-rail com intercooler, que rende 120 cv e 29,5 kgfm de torque entre 1.600 e 2.800 rpm - e nova suspensão traseira - antes, com molas helicoidais e agora multilink -, a Mahindra quis torná-lo mais civilizado, mais apropriado para condução em circuitos urbanos e, espera-se, mais conhecido pelo consumidor.
Uma das vantagens do M.O.V. é não ter concorrentes. Nenhum SUV com 7 lugares, motor a diesel e tração nas 4 rodas sai hoje por menos de R$ 170.000,00, enquanto a Mahindra sugere para seu SUV o preço de R$ 97.900,00, quase 43% menos. O custo x benefício parece imbatível. Colocamos o Mahindra à prova para saber se ele realmente vale quanto pesa.
E pesa mesmo. Parrudo, ele não é tão comprido (4,32 m), mas é largo (1,78 m) e bem alto (1,92 m), além ter tração 4x4. Não surpreendem, portanto, seus 1.935 kg vazio - dentro da expectativa para seu porte. Fosse mais pesado talvez o motor mHawk sofresse para o empurrar, mas a despeito da potência reduzida ele não decepcionou em nenhuma das situações de desempenho às quais foi submetido durante a avaliação.
A Mahindra enfatiza que o M.O.V. não é um SUV urbano, mas um jipe de verdade com alguma versatilidade para a família. Era de se esperar que o caminho até a Pedra Grande, em Atibaia (SP), fosse superado sem drama. A chuva que caiu por lá nos dias da avaliação não chegou a deixar atoleiros na subida, mas lavou o excesso de poeira e deixou valetas e princípios de erosões por todo o trajeto. E o M.O.V. agiu como se a subida fosse uma reta com asfalto ruim. Nem mesmo a tração 4x4 foi necessária; ele sequer patinou. Na tentativa de provar suas capacidades off-road, quase no fim da subida apontei para uma pedra íngreme e lisa; tração integral engatada, lá foi ele com seus bons ângulos de ataque e saída (31 e 21 graus) e nenhuma dificuldade. Subimos, manobramos, voltamos e os freios mostraram a que tinham vindo, segurando o carro com vigor e jamais apresentando qualquer tendência ao fading.
"Desaforo", pensei. Fui procurar outra trilha fora do roteiro turístico tradicional. A rota ficando cada vez mais estreita, água da chuva sem ter para onde escapar, ingrediente essencial para um barro gostoso e pronto, o Mahindra encontrou sua casa. Não foi nenhum rali transamazônico, convenhamos, mas tenho minhas dúvidas se um crossover urbano com tração 4x4 sob demanda venceria as ladeiras enlameadas e escorregadias que o M.O.V. enfrentou naquela tarde. Bravo.
No caminho de volta a "civilidade forçada" deste Mahindra ficou ainda mais evidente. Ele encara o asfalto, mas não foi feito pra andar ali. Não espere acelerações brutais; ele não é desses nem precisa ser. Mas fique tranquilo em retomadas e ultrapassagens que o torque é suficiente e chega cedo. A altura elevada o faz adernar um pouco nas curvas, mas ele se mantém na trajetória e não causa insegurança. É normal esperar embreagem e câmbio um pouco duros num veículo com a proposta do M.O.V., por isso não surpreendeu uma perna esquerda cansada no trânsito pesado. Os engates são regulares e a direção, ainda que o volante seja grande e tenha má empunhadura, só pesa em manobras de estacionamento. É desnecessário falar da suspensão no trânsito urbano; tendo enfrentado a terra com tanta maestria, as irregularidades do asfalto parecem brincadeira de criança.
O problema é que ele convence mecanicamente, mas peca em outros muitos aspectos. A lista é grande:
- O design datado e exageradamente detalhado nem seria um problema tão grave, já que a gente se acostuma, não fossem as falhas na pintura e os encaixes malfeitos das partes da carroceria, como para-choques e apliques plásticos.
- A ergonomia é bipolar. A alavanca de câmbio, por exemplo, tem haste longa e fica próxima da mão direita, enquanto o ajuste da coluna de direção é duro demais; os comandos elétricos dos retrovisores tem excelente acesso, enquanto os dos vidros elétricos é recuado demais; há apoios de braços em ambos os bancos dianteiros, mas eles atrapalham a fixação dos cintos de segurança e dificultam o acesso ao controle de acionamento da tração integral; e por aí vai.
- O volante, como já foi dito, tem má empunhadura. Mas não é só, os controles do áudio ali tem acabamento ruim e acionamento inconstante. Os bancos de couro têm costuras irregulares e o material parece não ter sido devidamente estirado. E estar ao volante não é a melhor coisa do mundo; a posição de dirigir tem pouca opção de ajustes e cansa.
- Os encaixes no painel são ruins e com rebarbas. Há falhas imperdoáveis de acabamento, como pontas do carpete saindo da parte de trás do painel e caindo sobre os pedais, o que poderia prejudicar, inclusive, a segurança. Falando nisso os tapetes, principalmente o do motorista, poderiam ter presilhas de fixação para evitar que escorreguem para baixo dos pedais, especialmente em trechos fora-de-estrada. Os plásticos, ainda que sejam melhores que a imitação de madeira do antigo Scorpio, ainda têm texturas de aspecto duvidoso; o layout fica carregado demais.
- Faltam itens essenciais a um carro de seu porte, proposta e preço: o M.O.V. não tem sensor de estacionamento, central multimídia, ajuste de altura dos bancos, temporizador para fechamento dos vidros, levantador automático de vidros a partir do acionamento das travas elétricas, computador de bordo, espelho no para-sol do motorista, luz no espelho do para-sol do passageiro e só há 2 esguichos no lavador de para-brisa.
Quase perdendo o fôlego para narrar tantos defeitos, seria injusto não pontuar algumas de suas principais qualidades. Além do bom desempenho no off-road o Mahindra M.O.V. se mostrou econômico, registrando uma média superior a 10 km/l de diesel somados os percursos na cidade, estrada e terra. A visibilidade para todos os lados é excelente e o espaço interno também é bom, desde que os bancos dianteiros não fiquem totalmente recuados - considerando a altura média da população brasileira, isso não há de ser problema. Nichos e porta-objetos estão espalhados por toda a cabine. A segunda fileira tem encostos rebatíveis e reclináveis, e na terceira fileira, como é comum nos veículos de 7 lugares vendidos por aqui, só crianças se acomodam bem. Por outro lado, com esta rebatida ou retirada o espaço para bagagens fica bem grande (a Mahindra fala em 120 litros com todas as fileiras no lugar, 980 litros com a terceira fileira rebatida e 1.200 litros com esta retirada) e o acesso é fácil, com a porta traseira se abrindo para o lado e não para cima.
Aceitáveis, mas não excelentes, são o nível de ruído interno e a lista de equipamentos de série. Pelo preço sugerido o comprador do Mahindra M.O.V. leva ar condicionado analógico com saídas para o banco traseiro, direção hidráulica com coluna regulável em altura, vidros elétricos nas 4 portas com one-touch para subirem e descerem os dianteiros, travas e retrovisores elétricos, sistema de áudio com CD/MP3 player e entradas auxiliares (com equalização mediana), faróis de neblina, faróis principais com ajuste de altura e follow me home, os já citados bancos revestidos em couro, piloto automático, ABS e airbag duplo.
Rústico, o Mahindra M.O.V. está longe de ser perfeito. Seria bom a Bramont investir em melhoras na qualidade de montagem e acabamento, bem como pensar em itens que há tempos deixaram de ser frufruzices, especialmente para o tipo de pessoa que compra veículos com o perfil deste indiano. Os quase R$ 100 mil que se pagam por um M.O.V. compram resistência, mas não luxo; espaço, mas não necessariamente conforto; versatilidade, mas sacrificando certas conveniências. Um amigo meu diria que é carro para gente que tomou leite tirado direto da vaca, não para urbanóides criados a Leite Ninho.
Fotos: Maximiliano Moraes
E pesa mesmo. Parrudo, ele não é tão comprido (4,32 m), mas é largo (1,78 m) e bem alto (1,92 m), além ter tração 4x4. Não surpreendem, portanto, seus 1.935 kg vazio - dentro da expectativa para seu porte. Fosse mais pesado talvez o motor mHawk sofresse para o empurrar, mas a despeito da potência reduzida ele não decepcionou em nenhuma das situações de desempenho às quais foi submetido durante a avaliação.
A Mahindra enfatiza que o M.O.V. não é um SUV urbano, mas um jipe de verdade com alguma versatilidade para a família. Era de se esperar que o caminho até a Pedra Grande, em Atibaia (SP), fosse superado sem drama. A chuva que caiu por lá nos dias da avaliação não chegou a deixar atoleiros na subida, mas lavou o excesso de poeira e deixou valetas e princípios de erosões por todo o trajeto. E o M.O.V. agiu como se a subida fosse uma reta com asfalto ruim. Nem mesmo a tração 4x4 foi necessária; ele sequer patinou. Na tentativa de provar suas capacidades off-road, quase no fim da subida apontei para uma pedra íngreme e lisa; tração integral engatada, lá foi ele com seus bons ângulos de ataque e saída (31 e 21 graus) e nenhuma dificuldade. Subimos, manobramos, voltamos e os freios mostraram a que tinham vindo, segurando o carro com vigor e jamais apresentando qualquer tendência ao fading.
"Desaforo", pensei. Fui procurar outra trilha fora do roteiro turístico tradicional. A rota ficando cada vez mais estreita, água da chuva sem ter para onde escapar, ingrediente essencial para um barro gostoso e pronto, o Mahindra encontrou sua casa. Não foi nenhum rali transamazônico, convenhamos, mas tenho minhas dúvidas se um crossover urbano com tração 4x4 sob demanda venceria as ladeiras enlameadas e escorregadias que o M.O.V. enfrentou naquela tarde. Bravo.
No caminho de volta a "civilidade forçada" deste Mahindra ficou ainda mais evidente. Ele encara o asfalto, mas não foi feito pra andar ali. Não espere acelerações brutais; ele não é desses nem precisa ser. Mas fique tranquilo em retomadas e ultrapassagens que o torque é suficiente e chega cedo. A altura elevada o faz adernar um pouco nas curvas, mas ele se mantém na trajetória e não causa insegurança. É normal esperar embreagem e câmbio um pouco duros num veículo com a proposta do M.O.V., por isso não surpreendeu uma perna esquerda cansada no trânsito pesado. Os engates são regulares e a direção, ainda que o volante seja grande e tenha má empunhadura, só pesa em manobras de estacionamento. É desnecessário falar da suspensão no trânsito urbano; tendo enfrentado a terra com tanta maestria, as irregularidades do asfalto parecem brincadeira de criança.
O problema é que ele convence mecanicamente, mas peca em outros muitos aspectos. A lista é grande:
- O design datado e exageradamente detalhado nem seria um problema tão grave, já que a gente se acostuma, não fossem as falhas na pintura e os encaixes malfeitos das partes da carroceria, como para-choques e apliques plásticos.
- A ergonomia é bipolar. A alavanca de câmbio, por exemplo, tem haste longa e fica próxima da mão direita, enquanto o ajuste da coluna de direção é duro demais; os comandos elétricos dos retrovisores tem excelente acesso, enquanto os dos vidros elétricos é recuado demais; há apoios de braços em ambos os bancos dianteiros, mas eles atrapalham a fixação dos cintos de segurança e dificultam o acesso ao controle de acionamento da tração integral; e por aí vai.
- O volante, como já foi dito, tem má empunhadura. Mas não é só, os controles do áudio ali tem acabamento ruim e acionamento inconstante. Os bancos de couro têm costuras irregulares e o material parece não ter sido devidamente estirado. E estar ao volante não é a melhor coisa do mundo; a posição de dirigir tem pouca opção de ajustes e cansa.
- Os encaixes no painel são ruins e com rebarbas. Há falhas imperdoáveis de acabamento, como pontas do carpete saindo da parte de trás do painel e caindo sobre os pedais, o que poderia prejudicar, inclusive, a segurança. Falando nisso os tapetes, principalmente o do motorista, poderiam ter presilhas de fixação para evitar que escorreguem para baixo dos pedais, especialmente em trechos fora-de-estrada. Os plásticos, ainda que sejam melhores que a imitação de madeira do antigo Scorpio, ainda têm texturas de aspecto duvidoso; o layout fica carregado demais.
- Faltam itens essenciais a um carro de seu porte, proposta e preço: o M.O.V. não tem sensor de estacionamento, central multimídia, ajuste de altura dos bancos, temporizador para fechamento dos vidros, levantador automático de vidros a partir do acionamento das travas elétricas, computador de bordo, espelho no para-sol do motorista, luz no espelho do para-sol do passageiro e só há 2 esguichos no lavador de para-brisa.
Quase perdendo o fôlego para narrar tantos defeitos, seria injusto não pontuar algumas de suas principais qualidades. Além do bom desempenho no off-road o Mahindra M.O.V. se mostrou econômico, registrando uma média superior a 10 km/l de diesel somados os percursos na cidade, estrada e terra. A visibilidade para todos os lados é excelente e o espaço interno também é bom, desde que os bancos dianteiros não fiquem totalmente recuados - considerando a altura média da população brasileira, isso não há de ser problema. Nichos e porta-objetos estão espalhados por toda a cabine. A segunda fileira tem encostos rebatíveis e reclináveis, e na terceira fileira, como é comum nos veículos de 7 lugares vendidos por aqui, só crianças se acomodam bem. Por outro lado, com esta rebatida ou retirada o espaço para bagagens fica bem grande (a Mahindra fala em 120 litros com todas as fileiras no lugar, 980 litros com a terceira fileira rebatida e 1.200 litros com esta retirada) e o acesso é fácil, com a porta traseira se abrindo para o lado e não para cima.
Aceitáveis, mas não excelentes, são o nível de ruído interno e a lista de equipamentos de série. Pelo preço sugerido o comprador do Mahindra M.O.V. leva ar condicionado analógico com saídas para o banco traseiro, direção hidráulica com coluna regulável em altura, vidros elétricos nas 4 portas com one-touch para subirem e descerem os dianteiros, travas e retrovisores elétricos, sistema de áudio com CD/MP3 player e entradas auxiliares (com equalização mediana), faróis de neblina, faróis principais com ajuste de altura e follow me home, os já citados bancos revestidos em couro, piloto automático, ABS e airbag duplo.
Rústico, o Mahindra M.O.V. está longe de ser perfeito. Seria bom a Bramont investir em melhoras na qualidade de montagem e acabamento, bem como pensar em itens que há tempos deixaram de ser frufruzices, especialmente para o tipo de pessoa que compra veículos com o perfil deste indiano. Os quase R$ 100 mil que se pagam por um M.O.V. compram resistência, mas não luxo; espaço, mas não necessariamente conforto; versatilidade, mas sacrificando certas conveniências. Um amigo meu diria que é carro para gente que tomou leite tirado direto da vaca, não para urbanóides criados a Leite Ninho.
Fotos: Maximiliano Moraes
Nenhum comentário:
Postar um comentário