ALTA RODA, Fernando Calmon
“Quando a
esmola é grande, o santo desconfia”. Eis um dos provérbios mais populares e que
se aplica a um dos artigos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Reconhecido
como minucioso em excesso, além de abrigar nada menos de 341 artigos, fora os
anexos, o CTB deixou vários pontos por regulamentar, desde que entrou em vigor
em 22 de janeiro de 1998.
E não para
por aí. Coube ao Conselho Nacional de Trânsito (Contran) aprovar resoluções regulatórias,
com força de lei, sem contar as portarias do Departamento Nacional de Trânsito
(Denatran). Em dezembro de 2008, a coluna recebeu uma publicação que consolida
toda a legislação complementar. Trata-se de um calhamaço de 708 folhas de tamanho
ofício e letra miúda. Se atualizado até 2012, talvez alcançasse as 1.000
páginas.
Punitivo por
essência e quase nada educativo, no CTB há um conceito racional no Artigo 267:
“Poderá ser imposta a penalidade de
advertência por escrito à infração de natureza leve ou média, passível de ser
punida com multa, não sendo reincidente o infrator, na mesma infração, nos
últimos doze meses, quando a autoridade, considerando o prontuário do infrator,
entender esta providência como mais educativa.
§ 1º. A
aplicação da advertência por escrito não elide [N.R.: não elimina] o acréscimo do valor da multa prevista no § 3º
do art. 258, imposta por infração posteriormente cometida.
§ 2º. O
disposto neste artigo aplica-se igualmente aos pedestres, podendo a multa ser
transformada na participação do infrator em cursos de segurança viária, a
critério da autoridade de trânsito.”
Independentemente
de jamais um pedestre (ou ciclista) receber multa, esse artigo foi, afinal, regulamentado
e vige desde 2012, “apenas” 14 anos depois. Algo simples e justo, mas como tem
potencial de redução na arrecadação de multas, ficou esquecido. O motorista pode
redigir um recurso e pedir a conversão da multa, o que já desanima: poucos
estão informados e/ou conhecem os trâmites.
Porém, a
partir desse mês, o Detran do Distrito Federal, em rasgo de clarividência raro
no setor, colocou seus programas de computador para funcionar. Caso se enquadre
no Artigo 267, o infrator nem chega a receber notificação: ganha apenas advertência
por escrito, conforme prescreve o código. Está aí um exemplo para aplausos. Todos
os outros Detrans deveriam segui-lo, mas certamente não o farão, apesar das
facilidades atuais da eletrônica de controle. Na realidade, a regulamentação
nada impôs sobre o modo operacional e os governos não querem perder receita.
Mas há algo
perverso, a tal esmola duvidosa. Por qualquer meio, o motorista não pode
recorrer da pretensa infração convertida em advertência, mesmo sem concordar ou
ter como provar que é inocente. Deve aceitar o perdão, sem discutir. É ou não é
para o santo desconfiar?
RODA
VIVA
APESAR de a GM nada revelar, a nova
geração do Cruze (2015) será produzida na fábrica argentina de Rosario, como a
coluna já antecipou. Cessará a montagem CKD do modelo, em São Caetano do Sul
(SP). Tendência geral é essa: compactos aqui; médios-compactos, no vizinho. Por
razões de menor escala de produção e controle “frouxo” de conteúdo local na
Argentina.
PREÇO até R$ 2,9 milhões, motor V-12 dianteiro
(6,2 l/740 cv) no lugar do V-8, aceleração de 0 a 100 km/h, em 3,1 s. Ferrari
F12berlinetta foi pré-apresentado no autódromo de Interlagos, pouco mais de um
ano após Salão de Genebra. Importador, Via Itália, afirma que esse superesporte
pode lidar melhor com o dia a dia do que gerações anteriores. Inspiração
Porsche?
PRISMA vai bem com motor de 1 litro/80
cv (mais potente nessa cilindrada, juntamente com o 3-cilindros HB20 e Clio),
menos na estrada com carga total. Marchas precisam ser esticadas para ter agilidade.
Versão de entrada (R$ 34.990) permite opção da ótima central multimídia. Na
ergonomia, puxador nas portas, ruim; tampa do porta-luvas, ótima (abre para
cima).
FLUIDEZ de linhas e espaço interno
garantido por 2,7 m de distância entre-eixos, Cerato é aposta da Kia entre os
médios-compactos. Agora com motor flex de 1,6 l/128 cv (igual ao HB20), o sedã vem
completo, só versão topo. Mas seu preço disparou, ao não se enquadrar nas
regras do Inovar-Auto. Por R$ 67.400 (automático, mais R$ 4.500), difícil
concorrer.
OUTRO que perdeu competitividade em
preço foi hatch Hyundai i30, cujo motor 2-litros foi substituído pelo 1,6-L. Atrapalha,
ainda, a valorização recente do won sul-coreano. Nada dramático, como acontece
com o iene japonês, porém relação preço-equipamento imbatível, aos poucos, pode
sofrer erosão discreta.
Fernando Calmon, engenheiro e jornalista especializado desde 1967, quando produziu e apresentou o programa Grand Prix, na TV Tupi (RJ e SP) até 1980. Foi diretor de redação da revista Auto Esporte (77/82 e 90/96), editor de Automóveis de O Cruzeiro (70/75) e Manchete (84/90). Produziu e apresentou o programa Primeira Fila (85/94) em cinco redes de TV.
Sua coluna semanal sobre automóveis, Alta Roda, começou em 1999. É publicada em uma rede de 86 jornais, revistas e sites. É correspondente para o Mercosul do site inglês just-auto. Além de palestrante, exerce consultoria em assuntos técnicos e de mercado na área automobilística e também em comunicação.
fernando@calmon.jor.br e www.twitter.com/fernandocalmon
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