Daniel Messeder - Aston Martin Rapide |
Daniel Messeder tem 29 anos e é jornalista automotivo desde o ano 2000. Já passou pelas redações das revistas 4x4 & Cia, Oficina Mecânica / HOT e Carro, e desde 2008 é editor da Autoesporte (http://revistaautoesporte.globo.com). Tem como especialização os testes de veículos - incluindo medições em pista fechada com aparelho V-Box -, mas também atua na parte de bastidores da indústria (para revelar os segredos das fábricas) e em diversas pautas do setor automotivo.
Daniel Messeder, muito gentilmente, concedeu esta entrevista ao Blog RACIONAUTO com exclusividade. Confira na íntegra.
RACIONAUTO - Antes de tudo, muito obrigado por dispor de seu tempo para responder a esta entrevista. O que levou você ao jornalismo automotivo?
Messeder - Sempre tive vontade de trabalhar com carros desde pequeno. Pensei em engenharia, mas como sou mais ligado ao português do que à matemática (gosto bem mais de escrever do que fazer contas), acabei escolhendo o jornalismo automotivo. E meu primeiro trabalho já foi numa redação automotiva, como estagiário da revista 4x4 & Cia, quando eu tinha 18 anos.
R - Muitas pessoas sonham com esta profissão alimentando uma visão romântica e glamourosa sobre o ofício. À parte o prazer óbvio que há em pilotar carros dos sonhos, quais as principais dificuldades que um jornalista automotivo enfrenta?
M - O principal é o preconceito. Por trabalharmos com jornalismo de produto, invariavelmente somos acusados de “vendidos” para as montadoras quando falamos bem de algum produto e mal de outro. Isso faz parte da profissão. Além disso, temos de lidar com prazos cada vez mais apertados e o desafio de trabalhar para diversas plataformas. Aqui na Autoesporte, por exemplo, além da edição impressa, temos o site, a edição do iPad, os boletins na rádio CBN, os podcasts, os vídeos para o online... É trabalho que não acaba mais. Por isso mesmo é importante gostar do que fazemos.
R - Muitos testes e comparativos em publicações e sites especializados, ainda que não apresentem modelos esportivos, parecem ter sido escritos para pilotos. A ênfase aos dados de aceleração, estabilidade e dirigibilidade é enorme, maior que qualquer outra consideração ao modelo. Há muita polêmica ainda sobre o assunto “capacitação de condutores” no país, já que muitos consideram a atuação das autoescolas extremamente deficiente – diz-se que elas, hoje, apenas capacitam pessoas a movimentar carros em vez de formar motoristas. Além disso, grande parte dos consumidores de carros no Brasil mora em cidades grandes, com trânsito pesado e vias mal conservadas, e talvez jamais pilotem seus carros em circuitos fechados. Em contrapartida, há inúmeros relatos de rachas ilegais praticados nas grandes cidades e até em rodovias, onde os motoristas testam seus carros – preparados ou não – até o limite. Manter essa linha editorial, dando maior ênfase a dados como aceleração, velocidade máxima e aceleração lateral nos textos, não seria, de certa forma, um estímulo para esse tipo de atitude?
M - De forma alguma. Deixamos bem claro que nossos testes são feitos em pistas fechadas e próprias para tal finalidade. Usamos os números de testes para balizar o texto. Por exemplo: em vez de falar que o carro acelera bem (o que é vago), falamos que o carro acelera bem porque faz de 0 a 100 km/h em 8 segundos. Na frenagem vale a mesma coisa, no consumo... E outra: hoje todos podem fazer um test-drive de concessionária (uma voltinha no quarteirão) e depois escrever na internet que achou o carro isso ou aquilo. Nós alugamos uma pista, investimos em equipamentos de testes e pessoal especializado. Além disso, passamos dias com o carro, levando-o ao limite, mas também indo ao mercado com ele. Portanto, formamos uma base completa para escrever a matéria mais abrangente possível, não apenas dando ênfase aos testes de pista.
Daniel Messeder - Ferrari 458 Italia |
R - Qual o papel das revistas e sites automotivos na formação de motoristas?
M - Acho que no sentido da informação, explicando como é o funcionamento do carro e como dirigi-lo da maneira mais eficiente e segura possível. É interessante fazer reportagens com dicas de pilotos que podem ser aplicadas no dia a dia do motorista comum. Conhecer os limites de seu carro é belo passo para dirigi-lo com inteligência.
R - Houve uma mudança muito grande quanto à forma de divulgação da notícia com o advento da Internet e, atualmente, das mídias sociais. Muitos dizem que, dentro de algum tempo, essas ferramentas substituirão completamente as versões impressas das publicações especializadas. Qual sua visão a respeito?
M - Não sei se a revista de papel vai acabar, mas os títulos fortes permanecerão. É por isso que investimos pesado em nosso site e na edição do iPad (em breve para outros tablets também). Então, não importa qual meio seja (impresso ou digital), as publicações especializadas tradicionais continuarão a ter seu espaço.
R - Sabe-se que é comum receber comentários positivos e negativos sobre tudo o que se escreve, mas há na Internet, em vários fóruns e comunidades, comentários de leitores que se dizem insatisfeitos com os resultados de certos testes e comparativos, insinuando que as revistas abandonaram a imparcialidade e passaram a atender aos interesses das fábricas em divulgar seus produtos – motivo pelo qual, inclusive, a publicidade das fábricas nas revistas especializadas teria crescido espantosamente. Isso é verdade?
M - Quem fala ou escreve uma coisa dessas não tem o mínimo conhecimento de como funciona uma redação de jornalismo automotivo. Para você ter ideia, editores e repórteres só ficam sabendo quais anúncios vão sair na revista quando ela chega em nossas mãos. Portanto, não existe essa história de matéria comprada. Quem vende anúncio é o departamento comercial, e ele fica bem longe da redação. O que existe, claro, é uma preferência do repórter que pode aparecer no texto e não agradar ao leitor, afinal, ninguém gosta de ver ser carro (ou algum modelo de sua preferência) perdendo um comparativo. Mas isso acontece com todas as mídias automotivas, e não somente as revistas. Se um blog fizer um comparativo, ele também será questionado. Faz parte do jogo.
R - Recentemente, um dos mais visitados blogs automotivos brasileiros foi proibido de divulgar quaisquer notícias sobre produtos de uma certa fábrica. O episódio polêmico ganhou repercussão e houve críticas tanto à atitude da marca quanto à postura editorial do blog. O que você pensa sobre o aumento exponencial de blogs automotivos no país? Há espaço para todos?
M - Acho que os blogs fazem um trabalho muito legal, como se fosse o “lado B” da imprensa. Eu mesmo teria um blog se tivesse tempo... Mas claro que, como tudo na vida, há os blogs bons e os ruins. E o espaço maior será dado aos blogs com melhores informações, notícias exclusivas, flagras de futuros lançamentos em testes... Tudo com ética, claro, e dando crédito às fontes. Procuro sempre estar antenado com o que os blogs estão publicando. Hoje, o jornalista que não acompanhar alguns blogs está por fora.
R - Qual a sua opinião sobre o boicote das fábricas aos blogs automotivos em eventos de lançamento, entrevistas coletivas e pedidos de carros para testes?
M - Não que seja boicote, é uma questão de organização e prioridades. É que nem sempre há espaço para todos nos eventos das montadoras (inclusive os próprios órgãos de imprensa). E nem sempre há carros de teste em número suficiente. Até na grande imprensa, como a Autoesporte e outras revistas / sites / jornais, às vezes algumas marcas ficam de fora de comparativos e outras reportagens por falta de carro na frota de imprensa. Portanto, acho que alguns blogs (os maiores e os melhores) tendem a entrar no circuito com o tempo. Foi assim com os sites também.
Daniel Messeder - Audi R8 V10 |
R - Qual sua opinião sobre o exercício do jornalismo por blogueiros sem formação acadêmica?
M - Não é preciso ser jornalista para escrever bem. Mas também não dá para ler uma notícia (por mais interessante que ela seja) escrita toda errada. Então, acho que é importante que os blogueiros estejam sempre em busca de melhorias, seja lendo, escrevendo, apurando... Mas também acho bobagem os blogs partirem para uma linguagem igual a dos meios tradicionais, pois é justamente essa “liberdade” dos blogs que é interessante.
R - Quem, hoje, é inspiração para você em sua profissão?
M - Gosto de textos diferenciados, que fazem você se prender à leitura. Tenho o prazer de dividir a redação com dois caras que escrevem assim, o Glauco Lucena e o Hairton Ponciano Voz, jornalistas que acompanho desde muito antes de trabalhar com eles. Também admiro o Jason Voguel, de O Globo, e aprendi muito com o Josias Silveira, da Oficina Mecânica. Mas hoje minha maior inspiração vem das publicações estrangeiras, como as norte-americanas Motor Trend e Car and Driver, e as inglesas Car, Auto Express, Autocar, Top Gear e What Car?.
R - O que é faz um jornalista automotivo: formação, informação, intuição ou oportunidade? O que é mais importante?
M - Um pouco de cada. O importante é gostar e entender de carros, sem nunca perder a vontade de querer saber mais, fuçar o carro até embaixo dele, encher a engenharia e o marketing das montadoras de perguntas... Quanto melhor você apurar e tiver informação para colocar no texto, melhor será sua matéria.
Belíssima entrevista, e de quebra deu dicas preciosas para quem tem um blog ou quer começar um.
ResponderExcluirCurti \o
Abs
Kiko Molinari - http://carrosrarosbr.blogspot.com