sexta-feira, 20 de junho de 2014

JANELAS OPORTUNAS


ALTA RODA, Fernando Calmon


Essa verdadeira novela em que se transformaram os acordos automobilísticos entre Brasil e Argentina dentro do Mercosul completou mais um capítulo. Agora, outra solução-tampão, por um ano, até julho de 2015. Foi renovado o estranho regime chamado de “flex”, imposto pelos argentinos, que condiciona os volumes de exportação e importação, em dólares, na proporção de 1,5 para 1, para ambos os lados. Antes era de 1,95 para 1, mais favorável ao Brasil pelo próprio mercado.

Nos últimos anos, os carros brasileiros ocuparam de 45% a 50% do mercado argentino e os veículos provenientes de lá ficaram com algo entre 10% e 15% das vendas aqui. Se houvesse livre comércio, conforme previsto desde o início do Mercosul, há 23 anos, muitos desgastes de parte a parte teriam sido evitados. Já existe uma razoável complementação industrial, pois modelos compactos concentram-se no Brasil e os médios na Argentina, com raras exceções.

Desequilíbrio existe na indústria de autopeças, mas isso tem a ver com as escalas de produção muito maiores no nosso caso. Tal cenário não vai mudar, apesar de todas as pressões do país vizinho. Deve-se notar que o Brasil também pratica, em menor escala, protecionismo regional: programa de isenção de impostos para taxistas começou em 1995 (Mercosul, 1991), porém sempre foi e continua vedado aos veículos da Argentina. Só recentemente pessoas com necessidades especiais, igualmente isentas de impostos, tiveram acesso a modelos argentinos.

No entanto, abrem-se janelas oportunas. Neste segundo semestre o Mercosul deve, finalmente, assinar acordo com a União Europeia e estabelecer um prazo de 15 anos para eliminação gradual de todas as barreiras de cotas e impostos sobre veículos. Realmente uma grande notícia porque consolidará, em nossa região, o processo corrente de atualização tecnológica dos produtos. Segunda janela: encerra-se, em março de 2015, o período de três anos de cotas de importação do México, restabelecendo o livre comércio interrompido em 2012.

Assim, ficaria insustentável tentar um novo adiamento de abertura incondicional das fronteiras de Brasil e Argentina, no próximo ano. Existe até possibilidade de estabelecer um regime industrial conjunto que tentaria melhorar as condições de exportação de ambos. Esse colunista acredita que dependerá de resultado das eleições, aqui e lá, pois caso as oposições vençam há visões diferentes sobre intervenções em excesso na economia.

Interessante observar a convergência de preços dos veículos nos dois países. Historicamente os impostos eram mais baixos na Argentina, porém um tarifaço recente (concentrado em modelos caros) acabou por contaminar todos os produtos. Basta ver que o VW up!, lançado esta semana na Argentina, parte do equivalente a R$ 30.900 contra R$ 27.000 aqui. Mesmo com IPI cheio, previsto só para o final do ano, ainda assim sairá mais caro lá porque motores de um litro têm imposto menor no Brasil.

Já modelos com motores acima de um litro apresentam preços, hoje, praticamente alinhados. Dessa forma, conjugam-se os astros para que Brasil e Argentina parem de se desentender e façam funcionar, depois de mais de duas décadas, o almejado livre comércio sem desconfianças e rusgas.

RODA VIVA

TESE exposta em entrevista recente de Carlos Ghosn: “Abrir fábricas focadas em exportação é coisa do passado”. Para o executivo-chefe da aliança Renault-Nissan, disputar participação nos países de mercado promissor, como os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), torna mandatório produzir localmente. Explica, de fato, o porquê de tantas fábricas aqui.

AVALIAÇÃO simultânea das duas versões do Audi A3 sedã (1,8 L/180 cv e 1,4 L/122 cv) convence: versão de motor menor apresenta ótimo equilíbrio entre preço (R$ 94.900), desempenho (torque elevado proporcionado pela combinação turbo/injeção direta) e nível de equipamentos de série. Espaço no banco traseiro é ponto fraco, mas prazer ao dirigir compensa.

PROGRAMA Brasileiro de Etiquetagem Veicular tem pormenor importante. À medida que os carros melhoram consumo de combustível, em determinada classe de nota, é difícil não ficar para trás, se o fabricante deixar de agir. Assim, médias móveis impõem competição constante. No final do ano, novas exigências de emissões também poderão mudar classificações atuais.

DEPOIS de três anos, Chevrolet Camaro conversível estreia por R$ 239.900. Mercado é pequeno: cerca de 10% das vendas de 100 unidades/mês do cupê. Capota aberta o deixa atraente, próximo do modelo original de 1996. Motor V-8/406 cv lida bem com 126 kg de reforços. Faltam bom isolamento térmico do console central e ar-condicionado digital.

PREVISÕES apontam 300 milhões de carros compartilhados no mundo em 15 anos. Algo em torno de 15% a 20% da frota global. Ao entusiasmo atual, porém, se somam tropeços que atrapalhariam as projeções. Na Inglaterra, por exemplo, o programa Car2Go, do pequeno smart, não deu certo e se encerrou.


Fernando Calmon, engenheiro e jornalista especializado desde 1967, quando produziu e apresentou o programa Grand Prix, na TV Tupi (RJ e SP) até 1980. Foi diretor de redação da revista Auto Esporte (77/82 e 90/96), editor de Automóveis de O Cruzeiro (70/75) e Manchete (84/90). Produziu e apresentou o programa Primeira Fila (85/94) em cinco redes de TV. 

Sua coluna semanal sobre automóveis, Alta Roda, começou em 1999. É publicada em uma rede de mais de 100 jornais, revistas e sites. É correspondente para o Mercosul do site inglês just-auto. Além de palestrante, exerce consultoria em assuntos técnicos e de mercado na área automobilística e também em comunicação.

fernando@calmon.jor.br e www.twitter.com/fernandocalmon

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