Por Fernando Calmon, de Affalterbach, Alemanha
Modificar carros de série para torná-los mais ágeis, potentes e prontos a aguçar as melhores técnicas de guiar é um negócio próspero no mundo. Vários fabricantes, inclusive marcas generalistas, oferecem tais opções aos compradores. Marcas premium vão longe e o Trio de Ferro alemão se destaca com Audi (linha SR), BMW (M) e Mercedes-Benz (AMG).
No Brasil, chega a surpreender a relativa aceitação desses modelos, todos obviamente bem mais caros que os convencionais. Caso à parte e único é o dos AMG, que representam 4% de todas as vendas dos Mercedes-Benz no Brasil e no resto do mundo, apenas 2%.
Fundada em 1967 por dois ex-funcionários da fábrica e adquirida pela empresa alemã em 2005, a AMG prosperou. Instalada em Affalterbach, cercanias de Stuttgart, cidade sede da Mercedes-Benz, a antiga preparadora de modelos de série para competição hoje tem 800 colaboradores.
Com o lançamento do novo Classe A, aceitou o desafio de incursionar na seara dos motores de quatro cilindros, que se juntaram aos V-6, V-8 e V-12. E não brincou em serviço: o 2-litros turbo entrega nada menos de 360 cv e 45,8 kgf∙m de torque. Trata-se da maior potência específica (180 cv/litro) alcançada por um motor quatro-cilindros feito em série, hoje, no mundo.
A versão hatch chega agora ao Brasil, na faixa dos R$ 260.000. Em meados de 2014 será a vez do sedã CLA 45 AMG, bem perto dos R$ 300.000. Foi possível avaliar o mais recente produto da grife, depois de visita às suas instalações na pequena cidade de apenas 4.600 habitantes, em meio a um grande descampado.
Apesar das especificações técnicas impressionantes, o carro prima pela relativa discrição. Claro, é fácil identificá-lo por qualquer ângulo: grade dianteira com frisos duplos cromados, duas amplas aberturas sob os conjuntos óticos, spoiler discreto, saias laterais, rodas pintadas de preto a expor enormes discos de freio (13,8 pol. frontais e 13 pol. traseiros) ventilados/perfurados (pinças em vermelho), saídas de ar nos extremos do para-choque traseiro e ponteiras duplas de escapamento. Pneus são largos, de perfil baixo (235/40, aro de 18 pol.) e carcaças dos espelhos, em plástico/fibra de carbono. Nada de defletores ou aerofólios exagerados para conspurcar suas linhas.
Por dentro, além do acabamento de primeiro nível e bancos do tipo concha mais leves, garante toque esportivo por meio de fina costura na cor vermelha sobre o couro dos bancos, apoio de braços central, laterais e de ponta a ponta do painel frontal. Curiosamente, utiliza chave de ignição convencional (sem botão de partida) e alavanca seletora do câmbio no console de túnel (na coluna de direção, CLA comum). Atrás, sem mudanças, mas pelo formato do teto passageiro com mais de 1,80 m pode raspar a cabeça na forração.
Mecânica refinada: novos braços de suspensões, estas rebaixadas em mais de um centímetro (traseira com subchassi); barras estabilizadoras mais grossas; tração permanente nas quatro rodas de alta eficiência; câmbio automatizado de duas embreagens e sete marchas; sem falar no turbocompressor de dupla voluta e inter-resfriador para motor e câmbio.
Primeira impressão
Banco abraça de verdade o corpo, volante de base reta e pegada perfeita, pedais revestidos de alumínio e sem muitos botões na cabine para atrapalhar. É o esperado para arrancar tudo que o CLA 45 AMG dá direito. Pena o dia chuvoso ter atrapalhado a liberação plena de suas virtudes. Ainda assim, acelera como gente grande (0 a 100 km/h em estonteantes 4,6 s, dado de fábrica). Mantém sublime atitude em curvas (levíssimo e confiável subesterço), freios que respondem de forma eficiente e progressiva, além de direção precisa e comunicável. Nada de surpresas ao guiar, pois em um automóvel desse desempenho seria perigosamente desagradável.
Para quem sabe de fato o que está fazendo, é possível desligar o controle eletrônico de trajetória que perdoa os excessos e ajuda muito. Mas, volta automaticamente a atuar ao primeiro toque no pedal de freio. Em condições normais de uso o carro é suave para dirigir, próximo a um sedã compacto tradicional.
No entanto, ao selecionar a posição “S” no console, tudo se transforma. Nas trocas de marchas, que podem ser feitas a até bastante expressivas (para um motor turbo) 6.700 rpm, há o comemorado estampido no escapamento. Em reduções, ocorre aceleração interina antes do engate da marcha inferior. Hastes atrás do volante são ideais para comandar o câmbio e, no limite eletrônico de rotações, o motorista é que decide o momento de selecionar a relação seguinte.
Estava disponível, no carro avaliado, a configuração opcional de suspensão esportiva. Para uso no Brasil, ocupantes precisariam ter rins em ordem tal seu grau de dureza. Mesmo nas excelentes estradas alemãs, os solavancos e vibrações são fortes demais. Certamente, ideal para quem deseja dar voltas em autódromos e explorar seus dotes naturais ou assimilados. Na Alemanha, circuitos como os de Nürburgring oferecem essa possibilidade a preço módico.
Para arrematar, a AMG oferece um sistema de escapamento para quem se incomoda com o ronronar típico e limitado de um propulsor de quatro cilindros. Ah, também deixaram o sistema automático de desligar-ligar o motor no trânsito. Difícil é saber exatamente por quê...
Fernando Calmon, engenheiro e jornalista especializado desde 1967, quando produziu e apresentou o programa Grand Prix, na TV Tupi (RJ e SP) até 1980. Foi diretor de redação da revista Auto Esporte (77/82 e 90/96), editor de Automóveis de O Cruzeiro (70/75) e Manchete (84/90). Produziu e apresentou o programa Primeira Fila (85/94) em cinco redes de TV.
Sua coluna semanal sobre automóveis, Alta Roda, começou em 1999. É publicada em uma rede de 86 jornais, revistas e sites. É correspondente para o Mercosul do site inglês just-auto. Além de palestrante, exerce consultoria em assuntos técnicos e de mercado na área automobilística e também em comunicação.
fernando@calmon.jor.br e www.twitter.com/fernandocalmon
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